Vai ser milico na vida.

Paulo Pilotti Duarte
3 min readJun 6, 2021

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Quando eu me decidi sobre qual carreira eu iria seguir — após passar anos trabalhando com TI — eu me decide, também, por ser um pesquisador. Desde o início da minha graduação em Letras eu busquei contato com pesquisa e desenvolvimento na universidade. Passei, em 4 anos, por 3 projetos de pesquisa. Em todos a penúria pela falta de dinheiro sempre foi uma constante. As bolsas de pesquisa — tanto FAPERGS quanto PROPESQ — sempre foram mínimas (R$400 durante os meus 4 anos, e seguem sem reajuste até hoje) e não contemplavam nada mais além disso.

Eu fui aceito duas vezes para me apresentar fora do meu estado e nas duas vezes eu não tinha dinheiro para arcar com as despesas e, a universidade (e as agências de pesquisa) nunca deram apoio nenhum, restringindo a pesquisa universitária aqueles que tem dinheiro em casa. Não era o meu caso, claro.

A situação atual da pesquisa brasileira é muito pior do que nos anos Dilma (quando eu era aluno da UFRGS) e hoje não é apenas uma penúria, é miséria mesmo. A CAPES não sabe se vai ter dinheiro para pagar as bolsas de pós-graduação após novembro. A UFRJ estava em vias de fechar as portas por falta de dinheiro para manter as atividades básicas. O CNPq cortou 50% das bolsas de pesquisa que mantinha. Os orçamentos das duas maiores agências do país foi cortado pata níveis recordes (os menores, em valores absolutos, desde o ano 2000).

Mas isso muda muito se você é um militar.

Conforme a matéria Piauí, uma “bolsa farda” vai ser criada para que o Brasil envie pesquisadores militares e civis para o exterior para que esses pesquisem e se atualizem sobre questões estratégicas para o país. Nada demais, claro. Isso é necessário. O problema é a discrepância de valores num momento que, segundo o próprio governo, o país está quebrado.

Da Piauí:

O pesquisador militar, com a ajuda milionária do projeto das Forças, teria renda de 133 mil mensais (já incluído aqui seu salário). Um professor civil de uma instituição militar interessado em participar do projeto precisaria ser financiado pelas agências de fomento à pesquisa, como a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que oferecem bolsas anuais de até 30 mil dólares (o equivalente a 160 mil reais). Esse valor está no mesmo patamar do que é pago a pesquisadores de universidades públicas, que, além do auxílio no exterior, também continuam recebendo a integralidade de seus salários no Brasil durante todo o período de estudos. Num exemplo hipotético, um professor titular de uma universidade federal (salário inicial de 16,5 mil reais) que ganhe uma bolsa no valor máximo (160 mil por ano, 13,3 mil mensais) teria renda mensal de 30 mil — menos de um quarto do pacote proposto para o pesquisador militar.

Mas o montante ainda é muito mais do que esse, mesmo essa cifra já sendo abjeta.

A matéria continua:

A bolsa turbinada dos militares decorre de uma regra das Forças Armadas prevista na Lei de Retribuição no Exterior (LRE), em que todo militar enviado por mais de seis meses para fora do país, em missão ou curso, recebe uma série de benefícios, como auxílio moradia, que varia entre 40 mil e 50 mil dólares, ajudas de custo compatíveis com o número de dependentes presentes na viagem, além de uma equiparação salarial no país de destino. Se um coronel do Exército recebe vencimentos de 12 mil reais no Brasil, receberá um valor próximo de 12 mil dólares se o curso for nos Estados Unidos. O valor pago no exterior é a título de indenização, ou seja, não há necessidade de prestação de contas. Também entram no pacote a passagem aérea e o seguro-saúde. O valor total é, em média, de 250 mil dólares, mas pode escalar até 300 mil no Exército, segundo informaram militares participantes das reuniões.

É bom frisar que os valores encontram alguma resistência nas Forças Armadas, como ocorre em qualquer local tem aqueles que veem o quanto esse tipo de coisa é danosa à imagem da instituição e ao próprio erário. Mas são poucos e, normalmente, são vencidos pela máquina institucional. Mesmo assim, a bolsa segue valendo e o custo de um pesquisador militar hoje em dia bate em 1,6 milhões de reais.

Para aqueles mais novos, eu digo: entrem nas forças armadas, é o melhor caminho para ter uma vida sem aborrecimentos. Para os mais velhos, só nos resta chorar e pagar os juros dos bancos.

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Paulo Pilotti Duarte
Paulo Pilotti Duarte

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