Paz

Paulo Pilotti Duarte
3 min readFeb 20, 2023

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Solitude

Eu já perdi diversos amigos. Quando eu tinha 16 anos um deles morreu de aneurisma em casa. Soubemos no outro dia, aulas canceladas e muita gente sem saber o que fazer. Éramos adolescentes e a morte não era algo corriqueiro ou comum para aqueles jovens. Mas ele morreu. E em todos os outros dias isso ficava claro quando a mesa dele seguia vazia.

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Anos depois, aneurismo de novo, um amigo morre em SC. Amigo de infância, desde os 9 anos. Mais de 20 anos de amizade interrompidos assim, de repente, com um ataque em casa que ceifa a vida de uma pessoa que sempre esteve na vanguarda de viver. Brigava, bebia, não estudava, namorava e traía todas. Era um maluco. Mas era amigo. Jogava bola como pouco e brigava como todos nós na época. Sangue quente, cabeça amarela que rendia o apelido de ovelha. Gremista maluco. Brigamos de ficar sem se falar por meses por causa da dupla GreNal e por causa do Atari 2600. Mas sempre voltamos. Éramos o tripé daquela rua, eu, ele e o primo dele (meu amigo desde os 5 anos de idade). O aneurisma estourava novamente e tirava um pedacinho da minha vida. Saber que ele nunca mais vai arrumar brigas, nunca mais vai bater na minha casa as três de manhã com algum problema que ele arrumou na rua ou mesmo se escondendo da namorada que quase flagrou ele com outra. Não era uma pessoa em quem se espelhar. Mas era um daqueles amigos que a vida escolhe pra gente, coloca ele ali e faz o mundo ter aquele sentido agridoce da juventude e da adolescência. Aquele sentimento de que éramos eternos. Nunca fomos. E ele se foi.

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Pandemia. Quase 10 anos depois do segundo aneurisma. Um morte violenta de um amigo que briga com a mãe e comete suicidio. É assim que acaba a vida daqueles que vivem demais. A depressão levou ele na ponta dos dedos. Todo mundo se pergunta o que teria ocorrido. Ninguém nunca vai saber. Bebedeiras, esfihas de 39 centavos e ajuda com meu irmão caído no chão depois de beber até cair no dia da morte da minha prima. A lembrança que eu tenho desse amigo do meu irmão que virou amigo de todos na família é dele ajudando na mudança pro meu atual apartamento, carregando uma geladeira e depois correndo atrás de um Uber com uma escopeta enrolada numa toalha. Os doidos sempre vão antes.

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2023. Mais um dos malucos, que adorava reclamar no Twitter de tudo. Parceiro pra falar mal de pessoas, coisas, governos e vida. Noivo, enfermeiro e sem uns 4 parafusos na cabeça. Dizem que a violência buscava ele, perseguia. Pode ser verdade. Mas é mais um amigo, mais uma perda, mais uma alma maluca que se perde da minha vida.

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Aos poucos eu sinto que vou contando os que ficam, os que sobrevivem. 40 anos e eu já estou contando nos dedos de duas mãos os amigos que se foram. Queridos, malucos, depressivos, instáveis, vivos. Queria todos de volta. Queira que a perda não fosse sempre uma dor de ter ido cedo demais. Que todos descansem, Que encontrem a paz. Que sejam a paz.

V, D, P e R. Busquem a paz que talvez vocês não tenham tido em vida.

Vaya con Dios

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Paulo Pilotti Duarte
Paulo Pilotti Duarte

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